O aborto de repetição é definido como uma perda espontânea ou forçada até a 20 ou 22° semana, ou seja, até o quinto mês de gestação.
O aborto é considerado de repetição após a segunda ou terceira perda consecutiva.
Cerca de 10% das gestantes sofrem com o problema, porém muitas não investigam o que pode causar tal processo.
O aborto é uma fatalidade que acomete entre 15 a 20% dos casais e é mais comum na primeira gestação.
Os abortos são mais frequentes em mulheres com idade superior a 35 anos de idade, podendo indicar alguma anomalia ou malformação.
As causas de abortamento são variadas, podendo ser devido a uma perda normal, natural do ser humano e comum a todas as mulheres, fato este ligado principalmente à idade da mulher.
Mesmo aquelas que já tiveram filhos mas perderam um bebê sem causa justificada podem ter problemas específicos que devem ser investigados.
A idade da mulher é fator determinante na evolução do feto. Em um primeiro momento, se ela ainda possui uma reserva ovariana, como já sabemos após os 40 anos a taxa de oócitos tem uma queda acentuada, e por outro lado quanto mais idade, maior a chance de anomalias e maior a frequência de abortamento.
Confira abaixo a porcentagem de risco de aborto de acordo com a idade:
É consenso que quanto maior a idade da mulher, maior o risco de termos óvulos aneuplóides, e por consequência, termos embriões aneuplóides, que evoluem para aborto na maioria dos casos.
Portanto, em mulheres com idade avançada, é esperado que uma parcela de gestações acabará em aborto, sem outra causa associada.
Acima dos 35 anos o risco de aborto é em torno de 25% e aumenta progressivamente com o avanço da idade, sendo que após os 40 anos o risco de aborto é de 51%, e após os 45 anos o risco é de 93%.
A idade paterna não tem tanta importância como a idade materna na ocorrência de um aborto como fator isolado. Porém, em associação com a idade materna, pode aumentar o risco de aborto.
Se o pai tiver 40 anos ou mais em associação com a mãe de 30 anos aumenta em 3 vezes o risco de aborto.
Se o pai tiver 40 anos ou mais e a mãe tiver mais que 35 anos esse risco aumenta em 6 vezes.
Mulheres obesas (IMC >30) ou com baixo peso (IMC < 18), Cafeina em excesso (equivalente a mais que 3 xicaras de café por dia), uso de álcool em excesso, tabagista de mais de 20 cigarros por dia e usuários de drogas apresentam maior risco de aborto.
Nesses casos a mulher deve ser orientada a corrigir esses fatores antes da gravidez mesmo que nunca tenha tido aborto.
Existem diferentes causas para o abortamento de repetição, sendo que 50% dos casos ocorrem por motivos desconhecidos (causa idiopática). Dentre as causas conhecidas temos:
Cerca de 60-70% dos abortos espontâneos isolados apresentam alterações cromossômicas.
Apenas um cariótipo do material do aborto que pode confirmar esse diagnóstico e, na maioria dos abortos esse material não é analisado.
Um exame solicitado em casos de aborto de repetição é o cariótipo com banda G que deve ser pedido ao casal.
O homem ou a mulher podem ter o cariótipo alterado, e isso não significa que eles tenham alguma doença genética.
O casal geralmente tem o fenótipo normal porém apresenta um risco aumentado de formarem gametas com alterações cromossômicas.
Casais com aborto de repetição e cariótipo alterado têm risco em torno de 70% de sofrerem um novo aborto poraneuploidia e em torno de 1% de chance de terem um bebê com alteração cromossômica.
Por isso, nesses casos, deve ser oferecido o diagnóstico genético pré-implantacional (PGS) através da biópsia de embriões produzidos num ciclo de fertilização in vitro.
Mulheres que apresentam miomas com tamanho acima de 4cm ou que afetam a cavidade endometrial (principalmente os miomas submucosos) podem ter a anatomia uterina modificada, aumentando as chances de um aborto espontâneo.
Além disso, mulheres com pólipos ou portadoras de adenomiose também apresentam maiores chances de abortamento.
Para o diagnóstico é necessário recorrer a exames de imagem como ultrassom transvaginal, ressonância magnética de pelve, histeroscopia, e em alguns casos videolaparoscopia.
O tratamento vai depender de cada caso individualmente, podendo ser realizado uma histeroscopia cirúrgica ou até cirurgias mais complexas dependendo da malformação existente.
Pacientes portadoras de trombofilias geralmente utilizam medicação anticoagulante para evitar a formação de coágulos sanguíneos durante a gravidez.
Os tratamentos variam, podendo ser utilizado aspirina infantil, enoxaparina e corticoides.
Ainda existem controvérsias em quando utilizar as medicações para trombofilias e em quais alterações utilizar
Como na gravidez há uma sobrecarga da glândula tireoide, recomenda-se que em mulheres com hipotireoidismo em tratamento mantenha-se com o TSH abaixo de 2,5 mlU/l.
As mulheres com hipotireoidismo subclínico com auto-anticorpos contra a tireoide (antitireoglobulina ou antitireoperoxidase presentes), deve sempre ser tratado.
Na ausência de auto-anticorpos não há consenso, mas a tendência é recomendar o tratamento também.
Dosagem de prolactina e normalização dos níveis pode melhorar os resultados de uma gestação.
Endometrite crônica está presente em torno de 10% das mulheres com aborto de repetição porém ainda não está estabelecido se realmente está envolvida nesses casos.
A endometrite geralmente não causa sintomas ou apresenta sintomas discretos como o corrimento vaginal, dores pélvicas discretas ou sangramento vaginal irregular.
Parece que a endometrite pode produzir substancias tóxicas ao embrião, atrapalhando o processo de implantação.
É diagnosticada por biópsia de endométrio com anátomo-patológico compatível com infecção ou presença de plasmócito no estroma endometrial (CD138 e EMA) detectado por imuno-histoquímica.
O tratamento da endometrite é realizado com antibióticos específicos.
Na suspeita de falha de implantação é importante fazer a pesquisa para endometrite.
Causas Imunológicas
Células natural killers (NK): São linfócitos com receptor CD56+ presentes em sangue periférico e no útero e seu aumento tem sido relacionado à falha de implantação e aborto.
Geralmente é pesquisado através de uma biopsia endometrial com estudo imunohistoquimico durante uma histeroscopia
Não há consenso na literatura sobre o que é considerado um número normal de células NK no endométrio.
Há autores que consideram valores acima de 10% e outros, valores acima de 5%.
Todos os tratamentos voltados para reduzir a quantidade de células NK no endométrio (prednisona 20 mg/dia ou intralipid) ainda apresentam controvérsias se realmente reduzem a taxa de aborto.
O embrião pode ser considerado um corpo estranho, geneticamente diferente da mãe.
Para isso, o sistema imune materno tem que se adaptar para não “rejeitar” o embrião.
As diferenças genéticas entre os antígenos HLA da mãe e do pai são importantes na implantação e no desenvolvimento do embrião, pois essa diferença induz uma resposta imune ativa e protetora.
Em condições normais, o organismo da mãe inibe o sistema imune para que não ocorra esse ataque ao embrião impedindo, assim, a rejeição.
Esta resposta imune protetora (chamada resposta TH2) é deflagrada quando o antígenos HLA da mãe e do pai são diferentes.
Se os antígenos HLA do casal forem semelhantes, o sistema imune materno não reconhece o embrião como corpo estranho e não ativa a via protetora (TH2) então o sistema imune sem a proteção segue o caminho natural (chamada resposta TH1) e impede a gravidez ou provoca abortos.
Existe um exame chamado de CROSS-MATCH que detecta semelhança imunológica entre a mãe e o pai.
É realizada uma coleta de sangue da mãe e do pai para procurar anticorpos contra os linfócitos paternos no sangue da mãe, esses anticorpos são formados quando existe diferença de HLA entre os dois.
Se não estiverem presentes, era indicado um tratamento com as vacinas ILP protetores.
O Cross-Match é um exame que não apresenta evidências científicas comprovadas de sua eficácia.
Este tratamento não é mais permitido no Brasil conforme relato da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) – Ofício 2586/2015 CFM/DECCT.
Uma alternativa para fatores imunológicos seria usar G-CSF- Fator estimulante de colônias de granulócitos (Filgrastim).
Ele pode contribuir para a implantação e evitar abortos de repetição de causa imunológica e diminuir a quantidade de células NK..
As células T auxiliares (Th) são células do sistema imunológico que são ativadas quando o organismo reage a um corpo estranho.
São chamadas de células Th1 e Th2 e devem estar balanceadas.
Entretanto, se a resposta Th1 estiver em excesso poderá causar danos aos tecidos estimulando o fator de necrose tumoral alfa (TNF-alfa).
Muitos abortos e falha de implantação estão associados a níveis anormais de TH1 e TNF –alfa.
O fator e necrose tumoral alfa é necessário para estimular a invasão do blastocisto e a formação de novos vasos sanguíneos durante a implantação.
No entanto, se essa exposição for excessiva ou prolongada, pode resultar em uma implantação embrionáriainadequada e como consequência o aborto
Alguns estudos já demonstraram uma produção aumentada de Th1 e diminuída de Th2 em casos de abortamentos de repetição, e portanto, é conhecido que a imunidade celular desempenha um papel importante na rejeição dos embriões.
Estudos sugerem que o aumento da fragmentação do DNA do espermatozoide aumenta a taxa de aborto e pode estar associado a aborto de repetição.
As causas mais comuns de fragmentação alterada são varicocele, fumo, idade avançada e uso de drogas.
O tratamento dessas causas pode melhorar o problema associado ao uso de antioxidantes e vitaminas.
Mudança no estilo de vida, parar de fumar, praticar exercícios físicos, perder peso, evitar bebidas alcoolicas e cafeína em excesso podem ajudar e o uso de progesterona deve ser indicado além de suporte psicológico ao casal.
É importante definir como o aborto os casos dos abortos visíveis, ou seja, quando foi confirmada a gestação.
Muitos abortos não são percebidos ou não são diagnosticados pois ocorrem antes do atraso menstrual.
Numa gravidez espontânea, mais da metade dos embriões formados (55%) perdem-se, ou antes mesmo de serem implantados ou logo após serem implantados e nesses casos a mulher nem sabe que produziu um embrião naquele ciclo.
Na fertilização in vitro há um número maior de embriões que se perdem ainda em cultura no laboratório ou, se transferidos, não chegam a implantar (cerca de 50%).
Cerca de mais 15% implantam mas param de se desenvolver logo em seguida o que resulta num teste de gestação positivo, porém após alguns dias o teste dá negativo.
Isso é comum nos ciclos de fertilização in vitro pois devido a ansiedade, as mulheres tendem a fazer testes de gravidez precocemente e acabam percebendo a parada de evolução da gestação alguns dias após.
Isso abala emocionalmente o casal pois o embrião implanta no endométrio porém interrompe o desenvolvimento e frustra as expectativas do casal.